Agora sei de onde eu sou!
- Samuel lucas
- 14 de jun. de 2016
- 10 min de leitura
Eu tinha acabado minha missão e finalmente iria poder voltar para casa. Estava fora fazia dezesseis anos, mas parecia bem mais para mim. Já conseguia sentir o cheiro do ratatouille preparado por minha mãe. Meus ouvidos já conseguiam capitar o som das patas do Boris correndo pelo quarto atrás de um pedaço que fosse do tomate, seu ingrediente preferido do prato. Tudo tão relaxante.

Durou pouco aquele sentimento, um raio vindo do nada atingiu minha nave. Estremeci, por causa da missão fui obrigado a deixar de pilotar. Não lembrava mais como lidar com tempestades.
Olhando através do para-brisas percebi que o céu ficava cada vez mais escuro, ao mesmo tempo a chuva caia, já bem forte. A nave toda tremia. Começou uma sequência de turbulências. Todo o ambiente, que era azul metálico, foi ficando cada vez mais escuro e frio. O painel prata, com seus diversos botões e o manche pequeno, como de um avião, piscavam em um vermelho sangue, doía os olhos.
Só tive tempo de olhar para o Boris em uma moldura colada ao painel. Com o balanço a lâmpada que estava encima de mim caiu. Senti o rosto quente, um cheiro de ferro dominou o ar. Coloquei a mão na cabeça como quem tenta apagar aquele sentimento de angustia e temor do que viria depois. Apertei as mãos, trouxe os pés para perto do rosto. Aquilo era uma tentativa de apagar tudo de mim. Precisava apagar, desligar e tirar aquela luz da minha frente.
Levantei determinado a dar um fim em tudo. Numa tentativa frustrada apertei o botão que desligava o computador, mas nada acontecia. Apertei cada vez com mais força, de novo e de novo. A raiva tomou conta de mim. Aquela nave velha ia me deixar na mão? Liguei o piloto automático na esperança de que ele conseguisse controlar tudo e me fazer ir para casa.
-Vamos piloto, liga. Liga logo, por favor. Como uma chuva fez tudo isso?
-D-y-y-y-y-laann, estou com problemas para controle. Não posso te ajudar.
-Queeeeeeeeee??? Esse piloto idiota também vai me deixar assim, na mão? Computador quero um relatório. O que o raio causou de danos a nave?
-Atenção!! Senhor, o raio atingiu a turbina central. Não será possível recompor. Tente pousar. Caso contrario cairemos e não sobreviverá.
-Pousar? Mais onde? Só tem rochas. Talvez esse seja meu fim. Eu já estou cansado de tanta confusão, tanta briga parece ter me deixado fraco. Infelizmente eu desonrei a todos que dependiam de mim, não sou digno e acho que de certa forma isso foi a solução que o destino encontrou de evitar que eu voltasse para casa.
-Senhor, pouse. Pouse a nave, não consigo mais te ajudar. A nave vai cair.
A luz aumentou e a nave começou a girar. Eu não conseguia lembrar, por mais que tentasse o que devia fazer em situações como essa. Eu sempre viajava com aquela nave para onde eu queria e nunca tinha me metido em acidentes.
Com a mão esquerda apoiava no teto para tentar manter o controle, quanto com a direita me segurava no banco. Aquilo ficava cada vez mais rápido. Minha cabeça doía. O sangue ainda escorria no meu rosto. Fechei o olho e senti uma lagrima cair.
- Lembre-se filho, um líder só vira líder e se torna forte após uma lagrima brotar de seus olhos.
Podia ouvir papai dizer aquilo mais claro que nunca em meus ouvidos. Olhei no retrovisor e uma nuvem negra corria até mim. Respirei fundo, coloquei as luvas que estavam no bolso. Peguei o manche e consegui controlar o movimento, que apesar de tremer se mantinha reto. Tentava manter a calma e a lucides.
- "ERRO, ERRO, ERROOO..."- O computador gritava. Aquilo me enlouquecia. Eu tentava parar a voz a todo custo mas nada adiantava. Agora, aquilo? Além da luz que gritava aos meus olhos, a voz quase me sangrava os ouvidos.
A situação toda me distraiu. Ao tentar abaixar o som bati em uma montanha rochosa que estava a minha frente.
-Contagem regressiva. A nave se destruirá em 5...
Vidros entraram no meu rosto eu bati a cabeça com forma no manche. Eu provavelmente não sairia vivo dali.
Logo eu? Que piloto minha nave desde os 12 anos. Tirei minha carteira de piloto com todos os elogios possíveis da Aeronáutica do meu país. Logo, eu iria cair e morrer.Ouvi a contagem terminar de longe, enquanto desmaiava. Senti que tudo acabaria. Talvez fosse melhor para todos. Só tinha pena do Boris, e da mamãe. Sei que meu pai me culparia caso eu morresse. Respirei fundo. O último suspiro como chamam. Então do nada, eu acordei. Ãhnnnn?? Como assim?
Eu estava dormindo, aquilo não passava de um sonho. Ofegante olhei para os lados, ascendi o abajur que ficava no criado mudo e tentei me acalmar. Estava suado e cansado. Parecia até real. Era comum ter esse tipo de sonho mais do que realista, mas dessa vez eu sentia como se realmente vivesse aquele sonho.
Passei uns dois minutos sentado na cama. Ainda tremendo fechei os olhos e de repente ouvi uma voz doce e suave dizendo. "Dylan finalmente eu te achei aqui, eu preciso conversar com você"; Que? quem seria, um fantasma? Eu estava só no quarto. Então nervoso e obvio rezando para aquilo não ser uma assombração, abri levemente os olhos.

Uma mulher estava em pé, com um vestido azul, longo, volumoso, babados exuberantes, mangas compridas e luvas. Ela apalpava os cabelos altos, com uma mão e com outra segurava uma pequena bolsa, também azul. Pela penumbra dava para ver um pó caindo do cabelo dela enquanto ela mexia. Um pequeno chapéu que estava no topo da cabeça começou a cair. Ela delicadamente segurou ele depois, se sentou em um baú que estava perto da cama.
Ela puxou um espelho da bolsa arrumou o chapéu. Se olhou por um estante e olhou para mim. Pegou um blush e colocou sobre o rosto. Eu não pude para de olhar. Não tinha reação, a pele era tão pálida que quase refletia o próprio espelho. Apesar disso, ela exalava uma beleza que nunca vi antes. Era linda.
Por segundos acreditei ter morrido.
-A nave caiu e eu morri e agora, o que será de mim? Esse anjo veio me buscar então, vou para o céu, sendo assim, tá tudo bem, né?
Olhei para ela. Era estranho toda aquela pompa, sentada em um baú, velho. Só poderia aguentar ela mesmo, porque caia pedaços cada vez que ela respirava, imagina alguém maior? Ela parecia nem se preocupar. Tinha o rosto tenso e enrugado, parecia zangada com algo.
Respirei fundo, criei coragem e perguntei; “Eu morri na nave, não foi? Como isso funciona? Você é uma guia espiritual, meu anjo da guarda, uma santa? Eu sei, eu estou falando de mais, é que eu sou tímido, falo pouco, mas estou tão nervoso. Putz, ainda nem perguntei seu nome. Bom o meu é Dylan, mas isso você já deve saber né?”.
-PARA!!!!
-Desculpa, é-é-é que.
-Dylan, você não morreu, mas vai morrer se continuar. Eu estou cansada e te procurei a noite toda. Se você puder ficar quieto e me ouvir por favor.
-Ah sim, tu-tu-do bem.
Ela largou a maquiagem e pegou um celular, que começará a tocar. Ela não parava de digitar com uma pressa dizendo com frieza e impaciência, "Anda Dylan levanta, eu não tenho o tempo todo senta aqui do meu lado rápido!"
Me senti uma criança que ouve um adulto dando ordens, ao mesmo tempo acho que ainda achava que ela era um fantasma, eu estava com medo. Eu corri ainda confuso e assustado, não sei o que estava fazendo, mas pensava quem é? Como ela sabe o meu nome? Ainda não sei se morri.
Catei uma cadeira que guardava as minhas roupas sujas, jogadas ali em algum momento de impulso. Empurrei todas no chão e sentei à sua frente.
-"Q-q-quem é-é-é vo-vo-você"? - perguntei, com a voz tremula e gaguejando - eu podia ouvir meu próprio coração bater no peito, parecia que ia sair de dentro de mim a qualquer instante.
-Ah não, já vi que aquilo mexeu com sua memória de novo
-De novo?
E rápido ela disse - É, tá vamos lá. Dylan você não é humano.
-Sou um ET? dei um pulo imenso, levantei da cadeira tropecei nas roupas e caí no chão. Não podia estar mais apavorado. Como assim eu vim do futuro?
-É, Dylan, você é um astronauta do tempo.
-Do tempo?
Não podia acreditar que estava ali de frente com um anjo, mulher, não sei. Aquelas roupas do passado, aquele celular. Nada fazia sentido agora, eu era um astronauta e ainda do tempo?
-Na última viagem que fizemos para o passado você se perdeu. Sua nave quebrou e você caiu, eu não sabia aonde estava. Fiquei perdida.
Esse foi o único momento daqueles minutos todos, que eu vi ela não conseguir controlar suas emoções. O olho estava começando a encher de água. O rosto estava vermelho. A pele delicada e fina, enrugava-se, dessa vez não de raiva, mas tristeza. Fiquei chocado, parecia que realmente se importava comigo, mas eu não à conhecia. Ergui os braços e coloquei a mão eu seu rosto, limpei a lagrima que caia.
-Pelo visto antes de cair a máquina deve ter te trago para 2018. Além de adaptado suas condições para parecer que já estava aqui por muito tempo.
Ela respirou, pude sentir o quão fundo ela foi para buscar aquela calma interior, e o controle de suas emoções. Olhou para baixo, cruzou o olhar com o meu. Fechou a cara e tirou minha mão de perto dela. Voltou para o celular.
Agora, mudava levemente para um ar de superioridade, de consciência. Consciência maior que a minha, talvez. Ao menos é o que ela queria passar.Ela não se importava se eu conseguia ou não acompanhar aquela história, ela simplesmente falava.
- Mas e que-que-quem é vo-vo-cê? aonde estava “todo esse tempo”? - Se é que passou algum- ou qual o seu nome? De onde nós viemos? Estava confuso parecia estranho tudo aquilo, mas ao mesmo parecia que a alma gritava dentro de mim- “DYLAN TUDO É REAL”.
Dessa vez eu a encarava com um pouco de medo, mas também curiosidade, admiração. Ela balançou a cabeça, como quem diz não, porém com suavidade. Levantou o nariz e me olhou nos olhos. A boca parecia timidamente ameaçar um leve sorriso.
-Primeiro o que está olhando, minha roupa? -Disse com uma voz meio risonha, como uma criança sapeca- Era muito comum de onde eu vim, eu era a ditadora em moda, por tanto não fica me olhando como se eu fosse a esquisita aqui, olha como você está vestido.
-Não nem reparei na roupa, disse a ela sem graça, na verdade era muito estranha para mim...
Ela sorriu, e pois as mãos sobre o cabelo meio envergonhada, talvez por ter me acusado de julgar sua aparência e agora, achar que eu não tivesse feito. Quando na verdade estava fazendo em silencio.
-Vamos as apresentações. Pelo menos você sabe seu primeiro nome- olhou para o lado e suspirou forte impaciente- Meu nome é Darxla Louise Alexanna da Fronteira de Sul-Pirinéus.

Sou a princesa do reino de Orlu, nasci perto da fronteira, no Palácio Châto de Chenonceau, Quando meus pais e os empregados passavam as férias por lá. Desde cedo aprendi que minha missão era difícil, mas era ela quem poderia mudar o rumo de tudo e restaurar a paz entre os três reinos de Luna e a Terra.
Châto de Challain. Cidade de Potherie, sede do governo de Orlu

-Estou vindo da França de 1750. Precisava impedir que o pensamento republicano se espalhasse por lá. Meu álter ego quase destruiu tudo. Não entenderam o que eu queria fazer. E eu tive que sair de lá, antes de ir para a guilhotina.
- Guilhotina? Você tá bem?
- É, tô, tô sim. Ela passou a mão sobre o pescoço e parou por um segundo.
- A terra não é mais como antes Dyan. O ano de 2090 é tecnológico, mas vive uma desordem. Três grandes guerras foram tiranas, pois fizeram com que a população fosse disseminada. Até hoje, não se sabe o real motivo das brigas.
Acreditasse que a junção entre Languedoque-Rossilhão e Sul-Pirenéus , que formaram a Occitânia em 2016 tenha sido a responsável pela primeira guerra.
Ela buscava cada fato na memora, enquanto podia sentir que seu olhar ficava cada vez mais vazio.
- Após as grandes guerras, uma parte dos humanos foram para Luna,
um planeta entre a Terra e Marte. Luna, antes chamado de Nibiru, foi era considerado pelos a astrônomos como o Segundo Sol, aquele que restauraria a vida.

Outros humanos continuam vivendo na terra e Luna foi dividido em três reinos. Os três reinos fizeram um acordo para restaurarem a paz com a Terra. Hoje, 200 anos se passaram e os terráqueos continuam passando fome, sede e desigualdade. As guerras e mortes são financiadas por presidentes corruptos. A natureza foi esquecida e corre o risco de nunca ser restaurada. Nossa missão é garantir que a humanidade mude seus hábitos desde o passado para que o fluxo natural seja restaurado.
Eu acho que não entendia o que realmente ouvia. Ela falava e falava só escutava em coque. Quando tentava interromper para perguntar algo era interrompido. Seus dedos pousavam sobre meus lábios e ela continuava.
-Você vem do Império de Fonboard e Chanebleau. Sua mãe e seu pai junto com os meus pais e o Rei de SaxoLoh tentam sem sucesso lutar sem armas com a terra. Os terraqueos parecem não evoluir. Tudo para eles é arma.
Château de Chambord. Império de Fonboard e Chanebleau

Castelo de Fontainebleau, cidade de Barbizon .sede do governo do Império de fontainebleau

Darxla, me contou, que nossa principal missão é conscientizar os humanos a preservarem a natureza e cuidarem de seu planeta. Precisamos que eles estejam em paz uns com os outros e conosco claro. Não queremos que a realidade atual mude, mas queremos a paz e para isso devemos ir para o passado e tentar sutilmente mudar o futuro. A questão é que um grão de arroz tirado do lugar no passado muda uma montanha no futuro.
Já um pouco mais convencido, do que estava sendo dito perguntei:
- E porque você disse ser outra pessoa em 1750?

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